O Homem Do Norte: Hamlet na perspectiva nórdica | Crítica

Novo filme de Robert Eggers, diretor de A Bruxa e O Farol, estréia 12 de maio nos cinemas!

Poster de “O Homem do Norte”. Foto: Universal Pictures

Quando se fala de Robert Eggers, diretamente pensamos no terror psicológico denso e profundo, cheio de simbologias e semiótica presentes nas duas primeiras obras do diretor: A Bruxa e O Farol. Em ambos os filmes, a atmosfera densa, desconfortante e claustrofóbica causam ao espectador uma experiência muito mais aterrorizante do que jumpscares e violência gratuita pertencentes do gênero. Porém, o mais novo longa do cineasta “O Homem do Norte” (do original, The Northman) resolve seguir uma estrada diferente que seus antecessores, e troca o terror psicológico pelo drama épico e trágico. Ainda assim, a assinatura de Eggers segue firme e forte, se utilizando de diversos elementos de seus filmes anteriores para contar uma história de vingança, intrigas familiares e jornada psicológica do herói.

Não é errado afirmar que sua trama lembra a atemporal obra shakesperiana, Hamlet. Muitos, inclusive, vão pensar se tratar de uma adaptação livre da mesma. Mas a grande verdade é que Shakespeare se inspirou da história do conto viking do Príncipe Amleth para sua peça teatral, conto esse que é adaptado neste filme de 2022.

Seja você familiarizado, ou não, com Hamlet, todas as semelhanças estão presentes na mais nova obra de Eggers que traz uma jornada violenta e brutal de vingança, explorando a natural complexidade selvagem do homem.

Qual o enredo?

Cena do filme “O Homem do Norte”, Amleth interpretado por Alexander Skarsgård. Foto: Universal Pictures

Amleth (Oscar Novak, quando jovem), filho do rei Aurvandil (Ethan Hawke) , herdeiro do trono do Atlântico Norte, quando ainda jovem é preparado para seu futuro destino como o governador das terras vikings pelo seu pai. Através de rituais e crença nos deuses ancestrais, ambos criam uma conexão não apenas de paternidade, mas também um vínculo intrínseco de homem para homem. Porém, a traição de Fjölnir (Claes Bang) irmão do Rei, acaba por desencadear uma mudança nos rumos do reino e do príncipe protagonista, que presencia seu pai ser brutalmente assassinado por seu tio, e com isso deve fugir do Norte para escapar do mesmo destino que seu genitor. Ainda, testemunha sua mãe Gudrün (Nicole Kidman) ser raptada pelos traidores aos gritos desesperados, cena de extrema importância ao ser retomada no decorrer da trama.

Cena do filme “O Homem do Norte”, Amleth interpretado por Alexander Skarsgård e Olga interpretada por Anya Taylor-Joy. Foto: Universal Pictures

Nisso, Amleth foge de sua terra Natal, se torna um foragido e jura retornar para vingar a morte de seu pai e a captura de sua mãe. Após ser capturado como escravo por um povo distante, Amleth (Alexander Skarsgård, agora adulto) se torna um guerreiro valente, forte e destemido, pronto para iniciar sua jornada de vingança. Constantemente, com visões da vidente Seeress (Björk), é alimentado com motivações para prosseguir com seu objetivo e realizar a profecia que seu destino carrega. Ao retornar para o Norte, por demonstrar força, é vendido como escravo para servir o rei Fjölnir, e então, junto a também escrava e amante Olga (Anya Taylor-Joy) pode planejar e executar seu plano de reconquistar sua herança e reino.

Vale a Pena?

Cena do filme “O Homem do Norte”, Amleth interpretado por Alexander Skarsgård. Foto: Universal Pictures

Nessa nova emplacada de Eggers para o cinema cult, o diretor decide deixar um pouco de lado seu foco no gênero de terror e investe em adaptar uma clássica história de vingança, vinda de um antigo conto dinamarquês, que ficou mundialmente famoso pela influência direta na obra de William Shakespeare em Hamlet. E todas essas influências são totalmente notáveis nas narrativas pós-modernas, incluindo diversas adaptações da peça teatral para os cinemas. O maior exemplo seria de “O Rei Leão“, filme animado de 1994, que apresenta o drama shakespeariano para o público infantil, e acabou tornando o mito Hamlet, popular. Então, ver “O Homem do Norte” vai trazer uma sensação muito grande de familiarização na jornada de Amleth, podendo traçar diversos paralelos com a animação da Disney, principalmente na cena final, fazendo parecer uma versão de “O Rei Leão” para maiores. É possível, também, criar paralelos com clássicos como Ben-Hur (1959) e até mesmo a história bíblica de “José o Sonhador do Egito” (também adaptado em animação pela DreamWorks em José, o Rei dos Sonhos em 2000). Mas não se engane, o conto de Amleth apenas retrata um mito muito mais antigo do que qualquer história contemporânea, e não deve ser julgado como não-inovador ou ultrapassado. E é na forma que essa história é contada que se encontra a verdadeira pérola artística.

É através dos artifícios técnicos do diretor, que todas as batidas já familiares se tornam relevantes e grandiosas. Na forma que se conduz o roteiro, cheio de simbologias e presença de diversas camadas para a construção da motivação e psicológico do protagonista, que a trama ganha um ar muito mais profundo e denso. A trilha sonora, com a presença forte de gaita de fole, criando uma melodia que resgata o antepassado e situa no espaço-tempo. As batidas de tambores, criam o clima épico e brutal associadas aos povos vikings.

Na fotografia e palheta de cores, temos tons mais escuros como o cinza e azulado em cenas de divagações ou calmaria. Cenas mais claras e de variações de cores, porém com filtros pastéis em momentos chave de cenas em espaço aberto. E principalmente, a cor laranja, amarelo e preto que define a maior parcela de tempo do filme, em trechos aonde essencialmente o confronto é o destaque, seja por batalhas físicas, diálogos ou até mesmo confrontos psicológicos. A iluminação em sua maioria se dá pelo fogo, compondo o mise-en-scène como objeto cênico, mas também com papel de clarear cenários escuros e revelar o rosto dos personagens e todas as suas expressões, especialmente faciais, já que o longa se utiliza em abundância de takes fechados.

Cena de “O Homem do Norte”; Gudrün, interpretada por Nicole Kidman. Foto: Universal Pictures

O elenco, entrega excelentes atuações, com sotaque nórdico bem acentuado, mas que podem acabar incomodando algumas pessoas pelo excesso e forte dramaticidade. Os maiores destaques são Anya Taylor-Joy e Nicole Kidman, que entregam performances bem teatrais e impactantes.

Por fim, da para se dizer que “O Homem do Norte” não é inovador pela sua história, mas sim pela sua abordagem. Pela forma que Eggers conta um drama fabuloso, imerso em profundidade e conteúdo. Tematicamente aborda a vingança como um recurso de explorar a brutalidade, e selvageria do ser humano como algo inerente e destrutivo, o que torna a experiência nos cinemas um acerto imenso, dentro de tanto blockbuster comercial que chegam aos montes nas telonas.

5 comentários sobre “O Homem Do Norte: Hamlet na perspectiva nórdica | Crítica

  1. Parabéns pela riqueza de detalhes!
    Crítica muito bem desenvolvida.
    Agora fiquei com vontade de assistir ao filme.

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