O Telefone Preto e o poder da amizade (que deu certo) | Crítica
Ethan Hawke como o Sequestrador em O Telefone Preto / Foto: Divulgação

Com a promessa de ser um dos melhores filmes de terror do ano, O Telefone Preto chega às telonas cumprindo mais ou menos o que prometeu. Mais, porque é realmente um filme bem montado, atuado e com características marcantes que pautam o universo do terror. Menos, porque carrega consigo um final um pouco decepcionante.

Passando-se na década de 70, o filme acompanha os irmãos Finney (Mason Thames) e Gwen (Madeleine McGraw), duas crianças extremamente unidas que passam a enfrentar a ameaça d’O Sequestrador (Ethan Hawke), um homem misterioso que sequestra meninos na cidade de Denver.

O Telefone Preto começa morno, mostrando o cotidiano das crianças em um típico clichê estadunidense: uma escola cheia de armários, brigas com valentões e bullies, aulas que ninguém presta atenção de verdade. No entanto, apesar dos clichês, o filme apresenta logo de cara duas situações pouco ortodoxas, sendo elas o fato de Gwen ter sonhos clarividentes e Finney conseguir escapar de uma surra fatídica ao ser defendido por um amigo.

Somos também apresentados à figura do Sequestrador, um personagem tão real que poderia ser noticiado nas televisões do mundo todo hoje mesmo. Um homem em uma van preta, que usa uma máscara assustadora e finge ser um mágico para enganar crianças e as sequestrar. Assim que o espectador bate os olhos no personagem, é impossível não fazer outras milhares de ligações com relatos de true crime da atualidade.

O Sequestrador (Ethan Hawke) e Finney (Mason Thames) / Foto: Divulgação

Mas fato é que o filme de Scott Derrickson peca bastante logo em sua criação. Afinal, é de se esperar que uma obra de Joe Hill, filho de Stephen King, tenha algum valor. Surpreendentemente, o filho parece superar o pai ao criar uma atmosfera palpável e, principalmente, onde o valor da amizade faz algum sentido de verdade, e não é jogado aleatoriamente na cara do espectador, como o pai fez em It: A Coisa. Em O Telefone Preto, a amizade e cumplicidade são construídas desde o início com pequenas interações, deixando o final um pouco menos categórico.

O problema é que, apesar de consertar um dos erros de Stephen King, Joe Hill repete outros. Todas as crianças são personagens muito bem pensadas, cada um com suas nuances, medos, trejeitos; por sua vez, os adultos não passam de um bando de perdidos, que só estão ali porque a trama pede um pouco mais de seriedade. Uma polícia que não resolve nenhum mistério, pais completamente clichês e até mesmo a presença de um personagem fã de true crimes que só parece estar ali para dar trabalho mesmo. O único com alguma consistência é, claro, o vilão.

A atuação das crianças, no entanto, é primorosa. Desde os dois personagens principais até o elenco infantil secundário, ou seja, as crianças previamente sequestradas que passam a conversar com Finney pelo telefone. Por todas as vezes que aquele telefone tocava, dava para ouvir as pessoas prendendo a respiração na sala do cinema.

Scott Derrickson até tentou salvar esse enredo, mas em muitos momentos o filme se torna repetitivo e um pouco entediante. O final, então, nos entrega a melhor atuação de Mason Thames, mas pouca ou nenhuma conclusão sobre O Sequestrador e sobre os crimes de fato cometidos. O que poderia ser um bônus, tratando o espectador como alguém que não precisa de todas as informações para encaixar as peças, acaba dando espaço para um filme cheio de pequenos furinhos, que não atrapalham à primeira vista, mas deixam um gosto amargo ao fim. É sair do cinema com o gostinho de que aquelas quase duas horas de filme poderiam ser um pouco melhor aproveitadas.

Gabriel Ladeira

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